BRASÍLIA — O
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou nesta segunda-feira ao
Supremo Tribunal Federal (STF) o presidente Michel Temer e o ex-deputado
Rodrigo Rocha Loures, que já foi seu assessor, por corrupção passiva. Temer é
acusado de ter recebido propina do frigorífico JBS, usando Rocha Loures como
intermediário. Janot solicitou ainda que o presidente seja condenado a pagar
uma indenização por danos morais no
valor de R$ 10 milhões. No caso do ex-assessor, que se encontra
preso desde 3 de junho, o valor pedido é de R$ 2 milhões. (LEIA AQUI A ÍNTEGRA DA DENÚNCIA)
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Para que a
denúncia seja aceita — o que transformará o presidente em réu, afastando-o do
cargo — é preciso primeiramente obter o aval de dois terços dos deputados, ou
seja, 342 dos 513. Depois, é necessário ainda que a maioria dos 11 ministros do
STF aceite a denúncia. Janot pediu também a abertura de um novo inquérito
contra Temer e Rocha Loures para investigá-los por corrupção passiva e lavagem
de dinheiro em possíveis irregularidades em um decreto presidencial que regula
a exploração de portos.
Segundo
Janot, Temer usou Loures para receber R$ 500 mil de propina paga por Joesley
Batista, dono da JBS, que firmou acordo de delação premiada. O presidente e o
empresário se reuniram no Palácio do Jaburu, onde Temer mora, em 7 de março
deste ano. O encontro foi gravado por Joesley sem conhecimento do presidente.
Na reunião, Temer indicou Rocha Loures como homem de confiança. Posteriormente,
foi marcado um encontro entre o ex-deputado e o executivo da JBS Ricardo Saud,
quando o dinheiro foi repassado.
"Além
do efetivo recebimento do montante espúrio mencionado, Michel Temer aceitou, em
unidade de desígnios e por intermédio de Rodrigo Santos da Rocha Loures, a
promessa de vantagem indevida no montante de R$ 38 milhões. Tais condutas
revelam o crime de corrupção passiva, praticado pelos denunciados”, argumentou
Janot, acrescentando: “As provas trazidas aos autos reforçam a narrativa dos
colaboradores de que em nenhum momento o destinatário final da propina era
Rodrigo Loures. A vantagem indevida, em verdade, destinava-se a Michel Temer, a
quem os colaboradores e o próprio Rodrigo Loures se referem como 'chefe' ou
'Presidente'”.
“Rodrigo
Loures representou os interesses de Michel Temer em todas as ocasiões em que
esteve com representantes do Grupo J&F. Por meio dele, Michel Temer
operacionalizou o recebimento de vantagens indevidas em troca de favores pelo
uso da estrutura e órgãos do Estado”, afirmou o procurador-geral em outro ponto
da denúncia.
"ESQUEMA
ESPÚRIO", DIZ JANOT
Janot também
citou um dos trechos das conversas gravadas de Rocha Loures, na qual ele diz
que estavam obstruídos “os canais tradicionais” de propina: José Yunes e o
coronel aposentado da PM paulista João Baptista Lima Filho, ambos amigos de
Temer, corroborando a acusação de que o presidente foi beneficiado
“Tais
fatos demonstram um esquema espúrio que envolve Michel Temer e seus comparsas
há alguns anos. Nesta ocasião específica, Rodrigo Loures figurou como
representante de Michel Temer, substituindo outros que serviam como
intermediários para recebimentos de propina pretéritos”, afirmou Janot.
Temer
é investigado por corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização
criminosa. Mas, nesta primeira denúncia, Janot o denunciou apenas por
corrupção. No caso de obstrução, o procurador-geral afirmou que é preciso mais
tempo para analisar. Ele também solicitou o compartilhamento das provas com
outro inquérito que já investiga políticos do PMDB por organização criminosa.
Mas não houve ainda solicitação para que Temer seja investigado conjuntamente
nesse processo.
O
crime de obstrução de Justiça diz respeito à possível compra do silêncio do
ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e de seu operador, Lúcio
Bolonha Funaro. Janot entende que são necessários ainda esclarecimentos
adicionais, mas desde logo se manifesta pela manutenção da prisão preventiva
dos dois e da prisão domiciliar de Roberta Funaro, irmã de Lúcio.
REFERÊNCIA
À CENA DE ROCHA LOURES COM MALA
A
acusação tem como base a delação de Joesley Batista. Na conversa que teve com
Temer, o empresário contou que “liquidou pendências” com Cunha e Funaro; disse
estar “segurando” dois juízes e ter comprado um procurador que o investigava e
pediu a Temer a apresentação de um interlocutor para tratar de assuntos de seu
interesse no governo. O presidente apontou Rocha Loures, a quem definiu como de
sua “mais estrita confiança” e habilitado a falar de tudo.
Michel Temer e Rodrigo Janot - Agência O
Globo
Quanto
ao crime de organização criminosa, Janot destacou um inquérito já em curso no
STF em que deputados do PMDB e pessoas próximas são investigadas por esse
delito. Segundo o procurador-geral, as apurações do inquérito de Temer mostram
que houve continuidade da atividade da organização, com a possível participação
também do próprio presidente, Rocha Loures, o ministro da Casa Civil, Eliseu
Padilha, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, e o
ex-ministro Geddel Vieira Lima, todos do PMDB.
No
caso do decreto dos portos, Janot apontou conversas gravadas com autorização
judicial em que Rocha Loures e o próprio presidente da República tratam da
questão. Janot argumenta que a investigação poderia ser vinculada a um
inquérito já existente no STF, cujo relator é o ministro Marco Aurélio Mello.
Esse inquérito já tinha sido arquivado por falta de provas.
Para
justificar o pedido de pagamento de indenização, Janot diz que Temer “ludibriou os cidadãos brasileiros e,
sobretudo, os eleitores, que escolheram a sua chapa para o cargo político mais
importante do país, confiando mais de 54 milhões de votos nas últimas
eleições”. Destacou também que, em menor dimensão, Rocha Loures violou a
dignidade do cargo de deputado federal.
“A
cena do parlamentar correndo pela rua, carregando uma mala cheia de recursos
espúrios, é uma afronta ao cidadão e ao cargo público que ocupava. Foi
subserviente, valendo-se de seu cargo para servir de executor de práticas
espúrias de Michel Temer. Não há dúvida, portanto, de que o delito perpetrado
pelos imputados Michel Temer e Rodrigo Loures, em comunhão de ação e unidade de
desígnios, causou abalo moral à coletividade, interesse este que não pode ficar
sem reparação”, escreveu Janot.
No
documento, o procurador-geral entende que, antes do envio da denúncia à Câmara,
deve ser dado um prazo de 15 dias para que Temer e Rocha Loures se manifestem.
Depois, a Câmara irá analisar se dá prosseguimento à denúncia. Caso não dê
autorização, o caso ficará suspenso enquanto Temer for presidente. Se a
autorização for concedida, um afastamento de Temer do cargo só ocorreria após o
plenário do STF decidir se recebe ou não a denúncia. Nesse caso, o afastamento
seria por 180 dias para que o processo seja concluído. O presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ), assumiria o posto interinamente.
O Globo
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