Parlamentares que receberam doações de empreiteiras envolvidas na Lava Jato são indicados para o comando da CPI do Petrolão e comprometem as investigações antes mesmo de elas começarem
A Comissão Parlamentar de Inquérito encarregada de investigar as denúncias de corrupção na Petrobras foi instalada na tarde de quinta-feira 26 na Câmara sob o signo da suspeição. Mais da metade dos 27 deputados que compõem a CPI se elegeram em 2014 graças a doações feitas pelas empreiteiras acusadas de integrar o esquema de desvios de recursos na estatal. O dinheiro de sete empresas investigadas por prática de cartel e pagamento de propina foi para o caixa de campanha de 14 deputados. O montante envolvido é de pelo menos R$ 3,3 milhões. Entre os parlamentares beneficiados pelas empreiteiras que deverão ser investigadas pela CPI estão o próprio presidente da comissão, deputado Hugo Motta (PMDB-PB), e o relator, Luiz Sérgio (PT-RJ). Motta recebeu R$ 255 mil da Andrade Gutierrez e R$ 200 mil da Odebrecht na campanha de 2014 e Luiz Sérgio foi contemplado com quase R$ 1 milhão em recursos – R$ 50 mil da Toyo Setal, R$ 200 mil da UTC Engenharia, R$ 332,5 mil da Queiroz Galvão e R$ 380 mil da OAS.
REPUTAÇÃO MANCHADA
Relator e presidente da CPI recém-instalada para investigar os desvios na Petrobras, Luiz Sérgio (PT) e Hugo Motta (PMDB) (abaixo) receberam doações de empreiteiras investigadas
Apesar do flagrante conflito de interesses, a reunião de instalação da CPI foi marcada pela solitária oposição de quatro deputados do PSOL e do PPS à indicação de Motta e Luiz Sérgio para os cargos-chave. O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) apresentou questão de ordem alegando suspeição do presidente e do relator, mas o espírito de corpo falou mais alto. Os representantes das bancadas do PMDB, PSDB, DEM, PSC, Solidariedade e PT não acataram o pedido. O governo e os próprios partidos da oposição, com exceção do PSOL e do PPS, se uniram sob o argumento de que levantar suspeitas, no atual momento, sobre as doações de campanha aos membros da CPI comprometeria toda a composição da comissão. “É prejulgamento, a lei não admite”, ponderou o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP). Inconformado, Ivan Valente rebateu o tucano lembrando que uma das linhas de investigação judicial da Operação Lava Jato é a utilização de operações legais de campanha como forma de lavar dinheiro obtido por esquemas de corrupção. “As investigações do Ministério Público indicam que as doações podem ter sido utilizadas para receber propina.” O líder do PSOL, Chico Alencar (RJ), estrilou. “Vamos colocar vampiro para gerenciar o banco de sangue.” Em sua primeira intervenção como relator da CPI, Luiz Sérgio não se fez de rogado. “Quero agradecer os parlamentares de oposição que sempre me trataram de maneira respeitosa.”
A CPI, considerada uma das trincheiras de batalha de oposição no Congresso, começa a exalar um forte cheiro de pizza. As investigações da Câmara já nascem contaminadas. Afinal, sempre irá pairar a dúvida sobre de que lado os parlamentares ficarão. Se no lado onde se encontram os financiadores de campanhas ou naquele em que estão seus eleitores. Não bastasse a relação direta do presidente e do relator da CPI com as empreiteiras que devem ser alvo de investigação, os critérios que nortearam a escolha do comando da comissão revelam-se incompreensíveis, a não ser pelo prisma da conveniência política. Por exemplo, em uma bancada repleta de parlamentares com vasto currículo no Legislativo e no Executivo, escolheu-se para presidir a CPI um deputado de 25 anos que exerce apenas o segundo mandato parlamentar. O líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), saiu em sua defesa. “O PMDB tem total confiança em seus deputados que integram o grupo, inclusive no deputado Hugo Motta.” Não se esperava outra atitude do líder do partido. Afinal, Picciani foi um dos que endossaram a indicação de Motta, que deve retribuí-la obedecendo aos interesses da legenda na comissão.
Trata-se de um péssimo sinal emitido pelos congressistas às vésperas da divulgação da temida lista de políticos envolvidos no Petrolão pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. No final da última semana, a expectativa era de que a lista tivesse pelo menos 40 nomes, podendo chegar a 80, o que criará de imediato no Congresso uma espécie de “bancada dos zumbis” composta por parlamentares denunciados que vagarão pelo Parlamento até terem seu futuro definido pelo Conselho de Ética. A questão é: se na CPI o clima já é de camaradagem, como se comportarão os deputados quando tiverem de julgar os próprios colegas? – e ao que tudo indica, não serão poucos.
O cronograma de trabalhos da CPI será apresentado na próxima semana. Apesar de a escolha do presidente e do relator ter sido costurada pelos partidos, espera-se que as legendas adotem estratégias diferentes ao apresentar pedidos de convocação. O PT pretende chamar representantes das empreiteiras para depor, apostando que as empresas vão aliviar as responsabilidades do governo. Em contrapartida, o deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA) afirmou que o partido vai sugerir a criação de sub-relatorias para tratar dos amplos temas que envolvem o esquema de corrupção na Petrobras. A medida pretende tirar parte do poder de Luiz Sérgio como relator da comissão. “Aquelas CPIs que tiveram relatoria centralizada não deram certo. Não pode ficar na dependência de A, B ou C.” O PSDB, até semana passada, prometia trabalhar para levar o ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco para prestar depoimento. A legenda tem consciência, no entanto, de que as convocações não dependem da vontade de um só partido. Precisam passar pelo crivo do colegiado para que sejam aprovadas.
Fotos: ANDRE DUSEK/AE
ISTOÉ
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