quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

DEM vira “fenômeno” e encolhe no auge da fase de crescimento

 04.02.2021


Nonato Guedes

De um modo geral os partidos estão em crise na conjuntura política brasileira, incapazes de atuar como vetores de mobilização dentro da sociedade e alvos de um processo de desgaste que vai se tornando irreversível, devido a posturas fisiológicas adotadas em episódios como os de agora, nas eleições de Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. O PT é exemplo de agremiação que, mesmo com credenciais para se firmar na oposição ao governo Bolsonaro e às forças políticas de direita, padece de descrédito e de esvaziamento de quadros. Há, porém, um caso raro de partido que foi capaz de apequenar-se em plena fase de crescimento, conforme observou o colunista Josias de Souza: o Democratas (DEM), sucedâneo do antigo PFL, também chamado de Pêfêlê.

Josias afirma, em seu espaço no UOL, que as urnas municipais de 2020 tiveram para o DEM um sabor de biotônico. A legenda amealhou 8,3 milhões de votos – 61% a mais do que obtivera no pleito de 2016. Governava 268 cidades, passou a administrar 464 prefeituras. De repente, o partido começa a perder prestígio e posições. Deixou de controlar a Câmara Federal, que foi enfeixada até esta semana por Rodrigo Maia, um político vacilante que não teve coragem de submeter, sequer, à análise, pelo menos um dos inúmeros pedidos de impeachment do presidente da República. No Senado, com Rodrigo Pacheco (MG) no comando, o DEM ainda logrou escapar. O dano maior, porém, é que o partido perdeu identidade. Converteu-se, motu próprio, em sublegenda do bolsonarismo, vindo a reboque de um mandatário que sequer está filiado a partidos porque se julga acima de todos e que lança mão de legendas de aluguel para poder se candidatar, a partir daí dando “tchau” a quem não tem mais serventia.

Josias de Souza cita outra peculiaridade do Democratas e recorre a uma fina ironia para tanto. Diz ele: “O DEM passou a exibir uma firmeza tão singular que suas posições tornaram-se plurais. A legenda agora é a favor de tudo e absolutamente contra qualquer outra coisa. Em entrevista à Folha, o presidente nacional do partido, ACM Neto, expressou-se como um compositor. Compõe com todo mundo. Perguntado se o tucano João Doria deixou de ser uma opção presidencial para o DEM, o neto de Antônio Carlos Magalhães, o “Toninho Malvadeza”, respondeu com a consistência de uma porção de gelatina: “Da mesma forma que lhe afirmo que não temos compromisso com Doria, e nunca tivemos, também devo dizer que jamais descartamos essa possibilidade. Não é certo dizer que há compromisso, como não é certo dizer que há veto”. Raciocínio mais tortuoso do que esse, impossível…

A Folha perguntou a ACM Neto se descarta a hipótese de fechar com Bolsonaro. Outra resposta gelatinosa: “Nós não estaremos com os extremos. Você pergunta se eu descarto inteiramente a possibilidade de estar com Bolsonaro. Neste momento não posso fazer isso”. E pergunta de si para si: “Qual Bolsonaro vai ser? O dos dois últimos anos que passaram? Não queremos. Agora, haverá um reposicionamento? Para a construção de algo mais amplo, que não fique limitado à direita. Não sei. Então, não posso responder agora”. Diz Josias de Souza: “À certa altura fica-se com a impressão de que, para o DEM de ACM Neto, a perfeita solidão há de ter a presença de múltiplos presidenciáveis. “Portanto, seja João Doria, seja Luciano Huck, Ciro Gomes, Henrique Mandetta…Qualquer um dos nomes, vamos saber com o passar do tempo se vai ter mais ou menos chance”. Tanta irresolução – conclui Josias – submete qualquer partido ao risco de desaparecer. Parece anedota, mas a carta do suicídio entrou no baralho do DEM. O barulhinho que se ouve ao fundo é o ruído do velho Antônio Carlos Magalhães se revirando no túmulo”.

Em meio à geleia geral da política brasileira, com os partidos soterrados por conveniências pessoais, ficou cristalina, na implosão da aliança montada para eleger Baleia Rossi (MDB-SP) presidente da Câmara, a dificuldade em se criar uma frente ampla para 2022, como vinha sendo cogitado. O processo eleitoral, sobretudo na Câmara, deixou fissuras na tentativa de reconstruir pontes entre os partidos e possibilitar uma frente ampla contra o bolsonarismo no próximo ano. “Há desconfianças de lado a lado no espectro político”, informa o jornal “O Estado de S. Paulo”, acrescentando que articuladores dessa frente se questionam se as intenções vão esbarrar em personalismos e interesses fisiológicos dos parlamentares para atender suas bases eleitorais. A tal “frente anti-Bolsonaro”, como vinha sendo alardeado em órgãos da mídia sulista, agora é chamada, à boca pequena, de “frente fria”. Em Brasília, como se sabe, os humores em torno do Poder mudam com facilidade espantosa. E, definitivamente, o jogo não é para amadores, mas para profissionais.

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