05.10.2023
A Constituição Federal Brasileira completa 35 anos nesta quinta-feira (5), mas ainda há desafios a serem enfrentados para que as garantias de direitos conquistados com a promulgação do texto na década de 1980 sejam efetivamente respeitadas. Entre os desafios levantados por especialistas ouvidos pelo g1 estão: direitos sociais, democracia e harmonia entre Poderes.
A publicação da atual Constituição ocorreu, mais precisamente, em 5 de outubro de 1988 e se tornou o principal símbolo do processo de redemocratização nacional, após 21 anos de regime militar (leia mais abaixo). Ao analisar esse contexto, o professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB), Cristiano Paixão, argumentou que os desafios de 2023 não estão muito distantes daqueles do passado.
"Trata-se da universalização do texto constitucional, ou seja, a capacidade de interferir na sociedade de modo propositivo, com o objetivo de fazer valer seus principais objetivos: reconhecimento da dignidade da pessoa humana, construção de uma sociedade livre, justa e solidária, redução das desigualdades sociais e a promoção do bem de todos, sem discriminação", afirma.
E, para a completa vigência do Estado Democrático de Direito, segundo Paixão, é necessário romper barreiras como as das altas taxas de homicídio, das desigualdades sociais, das discriminações e da violência policial. Ainda segundo o professor, só assim será possível construir uma sociedade melhor.
aixão destacou ainda questões como o combate às fake news e ao discurso de ódio. Segundo ele, "é totalmente possível extrair do texto constitucional a vedação dessas posturas".
"O artigo 5º da Constituição, além de prever a liberdade de expressão, também estipula a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação", detalhou.
Já para o advogado constitucionalista Max Kolbe, a Constituição Federal estabelece de forma clara e objetiva as atribuições de cada Poder. Assim, ele menciona que, 'ainda que os Poderes da República sejam independentes e harmônicos entre si, há um sistema de freios e contrapesos absolutamente legítimo e eficaz previsto'.
"O fato de uma parcela da sociedade tecer intensas críticas ao ativismo judicial -- muita das vezes sob a premissa de ofensa a própria norma constitucional -- não seria suficiente para afirmar que há falha na harmonia entre os Poderes [...] Até porque, friso, se um Poder interferir na atribuição do outro, a própria Constituição Federal exemplifica o mecanismo eficaz para combater essa interferência. Ou seja, a eventual omissão do Poder Legislativo em não elaborar lei para se contrapor ao ativismo judicial não pode caracterizar ofensa à harmonia entre os Poderes", completou Kolbe.
Mesmo assim, o especialista destacou a independência entre os Poderes como um dos tópicos que devem nortear a discussão sobre o futuro da Constituição.
"A meu sentir, o maior desafio a ser perseguido por nossa atual Constituição é a harmonia e, acima de tudo, a independência entre os Poderes, ou seja, sem que um não interfira na atribuição do outro; o respeito aos direitos e as garantias fundamentais elencados no artigo 5º da Constituição Federal; a efetivação dos direitos sociais e, acima de tudo, efetivar a vontade do Constituinte Originário quando da efetivação do Preâmbulo Constitucional", explicou.
Diante disso, o advogado constitucionalista Mozar Carvalho analisa ser fundamental que a interpretação e aplicação da Constituição ocorra de forma íntegra, sem desvios motivados por conveniências políticas momentâneas.
Para tanto, o especialista relembra e reforça que a Constituição de 1988 é reconhecida pela riqueza de direitos e garantias fundamentais, bem como por estabelecer objetivos expressos para a construção de uma sociedade justa, livre e solidária.
"Penso que a concretização plena e íntegra do texto constitucional, respeitando seu espírito e finalidade, sem que seja cooptado por interesses políticos, é talvez o maior desafio que nossa Carta Magna enfrenta", pontou Carvalho
Carvalho pondera, contudo, que a própria prática política e institucional pode revelar desafios que o texto constitucional não consegue, por si só, superar.
"Recentemente, observamos um Senado por vezes inerte, e é possível argumentar que essa inércia decorre da situação de muitos de seus membros, que enfrentam processos em julgamento no STF. Esse cenário acaba por comprometer a efetiva atuação do Senado como contraponto aos excessos de outros poderes, especialmente do Judiciário", completou o advogado.
História da Constituição
O debate sobre a nova Constituição começou em julho de 1985, com a Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, também conhecida como Comissão Afonso Arinos. Composta por 50 membros, ela foi presidida pelo senador Afonso Arinos de Melo Franco.
O anteprojeto constitucional foi entregue em setembro de 1986 e embora não tenha sido encaminhado ao Congresso, foi publicado e serviu de base para debates sobre a construção da nova Constituição em um trabalho de diversas etapas.
O senador Afonso Arinos se tornou um dos constituintes, tendo sido designado presidente da Comissão de Sistematização, uma das etapas desse processo.
Direitos adquiridos com a nova Constituição:
- Criação do Sistema Único de Saúde (SUS);
- Educação como dever do estado;
- Elaboração do Código de Defesa do Consumidor (CDC);
- Acesso à cultura e proteção às manifestações culturais diversas;
- Reconhecimento e importância da biodiversidade;
- Possibilidade dos cidadãos apresentarem PEC com a assinatura de 1% do eleitorado;
- Política de valorização do salário mínimo.
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