21.04.2022
O Supremo Tribunal Federal condenou nesta quarta-feira (20) o deputado Daniel Silveira (PTB-RJ) a oito anos e nove meses de prisão em regime fechado por estímulo a atos antidemocráticos e ataques a ministros do tribunal e instituições como o próprio STF.
No julgamento, nove ministros
acompanharam integralmente o voto do relator Alexandre de
Moraes. Além da pena de
oito anos e nove meses em regime fechado, Moraes também estabeleceu perda do
mandato e dos direitos políticos e multa de R$ 212 mil.
As polêmicas
que envolvem Daniel Silveira
Entre os ministros do Supremo, há
divergência sobre a perda do mandato. Parte entende que é automática, em razão
da decisão do plenário do tribunal, cabendo à Câmara somente cumprir. Parte
considera que é necessária uma autorização da Câmara. Seja de uma maneira ou de
outra, informou reservadamente um ministro, só haveria efetivamente a perda do
mandato depois que se esgotassem as possibilidades de recurso.
O deputado ainda pode recorrer da
decisão ao próprio Supremo. A prisão só deve ser executada quando não houver
mais possibilidades de recurso.
Votaram pela condenação em regime
fechado o relator Alexandre de
Moraes e os
ministros André Mendonça, Luiz Edson
Fachin , Luís Roberto
Barroso , Rosa Weber , Dias Toffoli , Cármen Lúcia e Ricardo
Lewandowski , Gilmar Mendes e Luiz Fux.
Embora tenha votado pela
condenação, André Mendonça se manifestou a favor da
prisão por dois anos e quatro meses em regime aberto.
Kassio Nunes
Marques se posicionou
pela absolvição.
Pouco antes do início da sessão,
em pronunciamento na Câmara dos Deputados, Silveira
chamou Moraes de "marginal".
Em seguida, junto com o deputado
Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, foi ao prédio do STF para
acompanhar o julgamento.
Mas eles não
puderam entrar no plenário porque uma regra em vigor no tribunal,
editada em razão da pandemia, limita o acesso a ministros, integrantes do
Ministério Público, servidores do STF e advogados.
Voto do relator
O ministro Alexandre de
Moraes votou nesta
pela condenação de Silveira a oito anos e nove meses de prisão, em regime
fechado. No voto, Moraes, relator do caso, também condenou Silveira à perda do
mandato e à suspensão dos direitos políticos e, além da pena de prisão,
estipulou multa de R$ 212 mil.
Alexandre de
Moraes destacou a
"acentuada culpabilidade do réu". Ele afirmou que Silveira atuou para
impedir o funcionamento do Judiciário e da democracia. O ministro disse que as
condutas não podem ser tratadas apenas como uma frase jocosa, mas como
"graves ameaças ao Poder Judiciário e seus integrantes”.
“A liberdade de expressão existe
para manifestação de opiniões contrárias, jocosas, sátiras, para opiniões
errôneas, mas não para opiniões criminosas, discurso de ódio, atentado ao
Estado Democrático de Direito”, disse Alexandre de
Moraes
Segundo o ministro, a Constituição
garante "liberdade de expressão com responsabilidade".
"A Constituição não garante
liberdade de expressão como escudo protetivo para prática de atividades
ilícitas, para discurso de ódio, para discurso contra a democracia, para
discurso contra as instituições. Esse é o limite do exercício deturpado de
liberdade inexistente de expressão”, declarou.
Votos dos demais ministros
Nunes Marques - O ministro Nunes Marques
votou pela absolvição do deputado Daniel Silveira. Mas ressalvou que não ficou
caracterizado o crime de ameaça. Segundo ele, as falas não passaram de
"bravatas" incapazes de intimidar qualquer pessoa. "Da narração
dos fatos descritos, não se evidencia ameaça capaz de mal presente, quanto mais
futuro. Pretendiam hostilizar o Poder Judiciário. Nada mais são do que ilações
e conjecturas inverossímeis, não passando de bravatas. Lei exige mal grave,
sério. O que se vê aqui são bravatas. É certo que o que o acusado fez é difícil
de acreditar. Extrapolou e muito os limites do tolerável", afirmou. Nunes
Marques manifestou "perplexidade" com a Câmara dos Deputados pela
"injustificável omissão" em relação ao caso, conforme definiu.
André Mendonça - O ministro votou pela
condenação de Silveira pelo crime de coação no curso do processo, considerando
que houve ameaça contra autoridades. Mas divergiu em parte do relator. Ele se
manifestou por uma pena menor, de dois anos e quatro meses, em regime aberto.
Mendonça cobrou que o Supremo tenha rigor com ataques a outros poderes.
"Assim como o Supremo merece e deve ser respeitado, essas outras
instituições também merecem e devem ser respeitadas, sob pena de haver
desequilíbrio no tratamento das questões que envolvem cada poder. É bem verdade
que o deputado alertou que não estava fazendo ameaças ou que não estava
incentivando outros a agir daquela forma, mas apenas revelando 'um desejo
dele'. No entanto, pelo no contexto fica nítido o caráter de ameaça e de
incentivo em muitas das suas manifestações. A mera negativa nominal de que
esteja fazendo ameaças não possui condão de alterar o conteúdo do que é dito,
dê-se o nome que quiser".
Edson Fachin - O ministro fez uma
manifestação breve, dizendo que tinha um voto bastante "alongado" e,
por isso, se limitou a dizer que acompanhava integralmente o voto do
relator Alexandre de
Moraes, inclusive em
relação ao tempo de duração da pena.
Luís Roberto
Barroso - Barroso também acompanhou o voto
de Alexandre de
Moraes. Ele disse que não
se pode confundir liberdade de opinião com conduta criminosa. “É pacifico nesta
Corte e no mundo em geral que a liberdade de expressão não é um direito
absoluto e precisa ser ponderada com outros valores e direitos constitucionais,
inclusive a democracia, o funcionamento das instituições e a honra das pessoas.
E a imunidade parlamentar como igualmente acentuou o ministro Alexandre de
Moraes, não é um salvo
conduto para a prática de crimes sob pena de se transformar, o Congresso
Nacional em um esconderijo de criminosos. Para o ministro, é preciso
descaracterizar "a narrativa de que se esteja perseguindo alguém por crime
de opinião". Segundo ele, estabeleceu-se no Brasil uma crença de que
"a discordância político-ideológica e o direito de crítica — que são
legítimos — dão direito a mentir, dão direito a ameaçar e dão direito a
caluniar. Evidentemente, é preciso enfrentar esse tipo de mentalidade porque
isso não é liberdade de opinião, isso é crime em qualquer lugar do mundo".
Rosa Weber - A ministra votou pela
condenação e afirmou que o julgamento representa uma defesa da democracia.
"Não está em jogo aqui em absoluto a simples proteção dos juízes desta
Casa enquanto integrantes transitórios da Corte, mas sim a defesa do próprio
Estado Democrático de Direito, cuja existência é posta em risco quando se
busca, mediante o uso da palavra, minar a independência do Poder Judiciário e,
mais do que isso, a própria existência de instituição constitucionalmente
concebida como último refúgio de tutela das liberdades públicas”, declarou.
Dias Toffoli - O ministro acompanhou o voto
do relator. Ele afirmou que a ação de Silveira não pode ser analisada de forma
isolada e que há um movimento no mundo que envolve o totalitarismo e ataques à
democracia. “Assistimos nos últimos anos ataques orquestrados contra
instituições, democracia e estado de direito. O que estamos a julgar, ao fim, é
a defesa da democracia no nosso país. O que estamos aqui a decidir é a defesa
do estado democrático de direito. Não é a defesa de um ministro ou conjunto de
ministros".
Cármen Lúcia - "A imunidade não significa
impunidade para se fazer o que bem entender, não significa faroeste, são
condutas tipificadas. Estou acompanhando integralmente o voto do relator, com
vênias da divergência", declarou a ministra Cármen Lúcia.
Ricardo
Lewandowski - O ministro também entendeu
que a conduta de Silveira não está abarcada pela imunidade parlamentar.
"Comportamento do réu não está acobertado pela imunidade parlamentar, não
pode servir de escudo para ameaças à democracia". Ele acompanhou o voto do
relator.
Gilmar Mendes - O decano (mais antigo
ministro) do STF, Gilmar Mendes, reforçou a tese dos colegas de
que as ameaças e os atos antidemocráticos configuram crime. "Isto nada tem
a ver com a liberdade de expressão. E nem está coberto pela imunidade
parlamentar, que conhece claros limites", declarou. O ministro acompanhou
o voto do relator e também elogiou o trabalho da Procuradoria-Geral, que pediu
a abertura do inquérito e a condenação por fatos deploráveis.
Luiz Fux - O presidente
do Supremo Tribunal Federal agradeceu aos colegas que abreviaram as
manifestações a fim de que o julgamento terminasse nesta quarta. Ele também
elogiou o trabalho de Alexandre de
Moraes e acompanhou
integralmente o voto do relator.
Procuradora e Alexandre de Moraes m leitura de frases contra o ministro
Acusação
Aliado do presidente Jair Bolsonaro, Silveira é acusado pela
Procuradoria-Geral da República (PGR)
de coação no curso do processo, incitação à animosidade entre as Forças Armadas
e o Supremo e tentativa de impedir o livre exercício dos poderes da União.
No julgamento, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo,
citou diversos crimes que, segundo ela, foram cometidos pelo deputado.
Ela afirmou que Silveira agiu para impedir o funcionamento do
Judiciário, em especial, do Supremo Tribunal Federal, além de ter ameaçado os
ministros para impedir que eles executassem atos legítimos.Para a procuradora,
a imunidade parlamentar não pode ser usada para proteger ataques a
instituições.
Segundo ela, a Constituição deslegitima as condutas e discursos que,
apostando na violência e na grave ameaça, substituem o método democrático.
“Não se pode permitir que a força ou violência contra membros de
instituições essenciais possam ser legitimamente concedidas no espaço público.
Inviolabilidade do parlamentar não alcança, a despeito dos termos abrangentes,
o apelo à violência, declarações carregadas de grave ameaça”, afirmou.
Defesa
O advogado Paulo Faria afirmou que, embora tenha feito "críticas
ásperas", Silveira é alvo de um julgamento político.
Ele afirmou que a imunidade do parlamentar se aplica a
"quaisquer" palavras. "Querem condenar a todo custo um
inocente" declarou.
"Se aconteceram excessos pessoais, eu entendo que a deve-se
respeitar o princípio acusatório. O juiz não pode ser o julgador e vítima. O
caminho seria representação por calúnia e difamação. Não há que se falar de
coação no processo porque não houve". disse.
Faria afirmou que houve uma "atrocidade" jurídica ao longo do
processo com várias violações, segundo apontou, ao direito de defesa.
"Durante todo o andar processual da ação, eu diria que 99% foi
violação ao processo legal. Inúmeras manifestações da defesa, recursos, pedidos
eram indeferidos sumariamente com uma linha, duas linhas", declarou.
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VÍDEO: saiba quem é o deputado Daniel SilveiraRéu
Daniel Silveira virou réu em abril do ano
passado no âmbito do inquérito sobre atos antidemocráticos. Em
fevereiro de 2021, foi preso por
ter publicado um um vídeo no qual defende o AI-5, instrumento de repressão mais
duro da ditadura militar, e pregado a destituição de ministros do STF, ambos os
atos inconstitucionais.
Ao longo do processo, o deputado teve decretadas outra prisão e medidas
restritivas por descumprir ordens como a de uso de tornozeleira eletrônica e de
não se comunicar com outros investigados. O deputado chegou a atacar o Supremo
em novos eventos.
Em março, Alexandre de Moraes determinou
que ele voltasse a ser monitorado eletronicamente e proibiu que ele
participasse de eventos públicos. Silveira chegou a ficar dois dias sem sair da
Câmara para evitar a medida. Só depois que Moraes determinou pagamento
de multa diária de R$ 15 mil e bloqueio das contas do parlamentar, ele foi à
Polícia Federal para instalar o equipamento.
Em outra frente, na Câmara, o Conselho de Ética aprovou a suspensão do mandato de
Silveira por seis meses, por apologia ao AI-5. O parecer ainda não
foi encaminhado pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), ao plenário, que
precisa analisar a decisão do conselho.
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