quarta-feira, 10 de julho de 2013

Eriberto, o motorista que desnudou Collor

10/07/2013

No dia oito de julho de 1992, a tiragem da revista “Isto É” foi de 351.802 exemplares. O alcance se justificava, pela repercussão obtida pela edição de uma semana antes em que o motorista Francisco Eriberto Freire França, natural de Pau dos Ferros, no Rio Grande do Norte, desvendou a ligação entre PC Farias e a Casa da Dinda, onde morava o então presidente da República, Fernando Collor de Mello. Num depoimento-bomba, Eriberto falou dos depósitos que fez, cumprindo ordens, na conta de Ana Acioli secretária particular do presidente. Ele apanhava cheques na Brasil-Jet e Ana utilizava o dinheiro para pagar funcionários e despesas gerais da Casa da Dinda, além de contas de parentes de Collor. PC Farias pagava o aluguel e o combustível de carros utilizados por Ana Acioli.

 Acossado pelas revelações do motorista, Collor falou à Nação 48 horas depois das denúncias, apresentando uma defesa inconsistente. No Congresso, desenrolava-se já uma CPI, onde uma tropa de choque, que tinha como um dos expoentes o atual presidente licenciado do PTB, Roberto Jefferson, insistia em acusar que havia uma conspiração golpista em marcha.

Eriberto foi convocado à CPI, enfrentou insultos e pressões da tropa de choque collorida e deixou o Congresso sob aplausos, apesar do nervosismo que aparentou no início de seu relato, que durou cinco horas. A reportagem primeira da “Isto É” definia o motorista como testemunha-chave, e foi a partir daí que a situação de Collor tornou-se cada vez mais insustentável.  

A testemunha-chave perdeu o emprego, teve sua vida pessoal vasculhada e recusava o rótulo de herói. “Eu sou só uma pessoa que tenta viver honestamente, do seu trabalho”, definiu. Para a oposição, Eriberto era tudo isso, mas era, também, uma espécie de maldição ambulante. “É a vingança dos descamisados. Eles elegeram Collor, agora um deles vai derrubá-lo”, vaticinou o deputado José Genoíno (PT-SP), após o depoimento do motorista. Além de Jefferson, o pelotão de choque pró-Collor acolhia xiitas do poder como Ney Maranhão (PE), Odacir Soares (RO), José Carlos Vasconcelos (RN) e Euclydes Mello (AL). Na tentativa de desmoralizar o depoente, acusando-o de ter sido comprado por “Isto É”, Jefferson provocou: “O senhor disse que é pobre, mas abriu mão de um bom emprego. Vai viver de quê? O senhor tem recursos?”. Como um foguete, Eriberto respondeu em segundos: “Não, mas tenho força de vontade para trabalhar”.

Num certo momento da tensa sessão que colheu o depoimento do motorista, Jefferson provocou novamente: “O senhor vai querer dizer que está agindo só por patriotismo?”. E ele reagiu: “O senhor acha isso pouco?”. Elísio Curvo, do ex-PRN-MS, foi infeliz ao fazer insinuações maliciosas sobre os meios pelos quais a mulher de Eriberto, Patrícia, teria conseguido comprar um brinco de brilhantes que estaria usando. “São de bijuteria, eu comprei na feira do Guará, e o senhor respeite minha mulher”, irritou-se Eriberto. O então deputado federal pela Paraíba, Ivan Burity, tentou desqualificar França, apontando-o como mau motorista e mencionando que, certa feita, ele teria dado um cavalo de pau, derrapada que faz o automóvel girar 180 graus, conseguida com o acionamento de freio de mão. Seguro, Eriberto sustentou que deu, na verdade, apenas uma “rabiada”. Inspirado, José Genoíno liquidou a questão: “Burity, quem gosta de dar cavalo de pau é o presidente da República”. Numa manhã de terça, a caminho do Congresso, Eriberto só abriu a boca ao passar diante do Palácio do Planalto. “O presidente não está aí. Sua bandeira não está hasteada”, comentou. 
 
 
As investigações posteriores comprovaram que Ana Acioli movimentava uma conta com dois nomes e que apesar dos desmentidos, em tom patético, de Collor, ele continuava se encontrando com Paulo César Farias, que fora tesoureiro da sua campanha e, uma vez no poder, montou um esquema de corrupção sem precedentes até então na história republicana brasileira. 

Collor acabou se afastando do cargo, mas não evitou que o impeachment fosse decretado pelo Congresso. Virava-se, ali, uma página tumultuada da vida pública nacional. Jefferson, tempos depois, foi quem denunciou o mensalão do PT, infernizando a vida do presidente Lula e de cabeças coroadas do PT como José Dirceu e José Genoíno. PC foi morto em circunstâncias misteriosas na casa de praia em Alagoas, junto com a namorada Suzana Marcolino. 

Collor passou uma temporada no exterior. De volta ao Brasil, elegeu-se senador pelo PTB de Alagoas, e, hoje, nessa postura, dá pitacos sobre a crise provocada por manifestações de rua, tendo insinuado que há algo de perigoso sobrevoando os ares da política. Quando era presidente da República, ele se jactava de ter quebrado a barreira do som pilotando uma aeronave oficial.

cancaonoticias com Reporter PB

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