Henrique CoelhoDo G1 Rio
Entre 1º de janeiro de 2014 e 8 de julho de 2015 – período em que se agravou a crise nas Unidades de Polícia Pacificadoras – 15 policiais lotados em nas UPPs morreram em serviço no Rio de Janeiro. A média é de um policial morto a cada 40 dias neste intervalo, incluindo o soldado Alex Amâncio, de 34 anos, que morreu quando patrulhava a região próxima à UPP Andaraí, na última segunda-feira (6).
O G1 inicia nesta quinta-feira (9) uma série de três reportagens para contar a história dos policiais que morreram dentro de comunidades que contam com a presença de UPPs no Rio.
Policiais reclamam da falta de condições de trabalho e a Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) reconhece o aumento da violência, mas defende o projeto, que enfrenta seu pior momento desde a implantação da primeira unidade, no morro Dona Marta, em dezembro de 2008.
Em 2014, o numero de policiais mortos em serviço em áreas de UPP chegou a oito, o maior desde o início do projeto. Em 2015, foram sete até a noite de terça-feira (7).
Em 2012 foram registradas as primeiras mortes de policiais em áreas de UPP: quatro. No ano seguinte, mais três, somando 22 policiais mortos desde o início do projeto.
O número de policiais feridos em operações, patrulhamentos ou ataques às sedes e pontos fixos das UPPs também assusta. Segundo fontes do G1, 87 policiais lotados em UPPs foram baleados em 2014. Em 2015, até de 8 de julho, 53 policiais que pertencem às UPPs foram feridos a bala. Desde 2014, portanto, a média é de 1 baleado a cada quatro dias. A PM e a Coordenadoria da Polícia Pacificadora não informam números oficiais de feridos.
Até a publicação desta reportagem, a Secretaria de Estado de Segurança e o secretário José Mariano Beltrame não responderam ao G1.
'Projeto falido', diz viúva de PM
Em 2015, foram dois policiais mortos na UPP Cidade de Deus (Zona Oeste), mais precisamente na localidade conhecida como Apartamentos, em um intervalo de apenas 20 dias. Um deles eraBruno Miguez, de 30 anos, que levou um tiro na cabeça durante patrulhamento no dia 29 de janeiro. Um PM que estava com ele foi baleado no ombro, mas Miguez não resistiu. No dia 18 de fevereiro, Rogério Pereira da Silva, de 39 anos, foi baleado ao sair da base da UPP Apartamentos e também morreu.
Michelle Miguez, viúva de Bruno, conta em entrevista exclusiva ao G1 sente como se ele ainda estivesse presente em sua vida, e lembrou que o soldado estava havia pouco tempo na unidade.
"A UPP é um projeto falido, feito para os policiais morrerem. Pedi para ele não ir para lá, pois ele estava no Turano e lá era tranquilo. A Cidade de Deus é muito mais complicada, e ninguém nunca o ensinou a se movimentar lá", diz ela, que se emocionou ao lembrar do enterro de Bruno. "Quando eu olhei para o caixão, naquele momento queria ter ido com ele. E acho que não vai demorar muito para reencontrá-lo. Nosso amor é além da vida", garante.
Alemão é ponto crítico
Das 15 mortes ocorridas entre janeiro de 2014 e de 2015, 53% delas foram em comunidades dos conjuntos de favelas do Alemão e da Penha, vizinhos na Zona Norte do Rio: O soldado Wagner Vieira Cruz e o tenente Leidson Acácio (Vila Cruzeiro); a soldado Alda Rafael Castilho (Parque Proletário); o soldado Rodrigo Paes Leme e o capitão Uanderson Gomes (Nova Brasília); e o soldado Fábio Gomes da Silva (Fazendinha), todos em 2014. Em 2015, morreram o caboAnderson Fernandes (Fazendinha); e o soldado Marcelo Soares do Reino (Alemão).
“Lá é o inferno. Tive que me esconder várias vezes para não morrer”, resumiu um ex-soldado da UPP Fazendinha, que não se identificou à reportagem do G1 por motivos de segurança. No ano passado, um PM expulso pela corporação após críticas ao na época comandante das UPPs, Frederico Caldas, já havia dito que "o Alemão era um castigo"para os soldados.
"Não temos treinamento contínuo de tiro e muitos de nós não somos preparados para atuar em área conflagrada. Essa é a verdade.", confessou outro soldado da UPP Alemão.
Em 2015, foram feridos policiais de 20 UPPs diferentes, com destaque para a UPP Alemão, com 10 feridos. De janeiro até 6 de julho, 25 policiais foram baleados apenas nos conjuntos de favelas do Alemão e da Penha, de um total de 53 feridos a bala.
'Precisamos de mais parceiros'
O coordenador operacional da CPP, Ivan Blaz, reconheceu que, desde meados de 2013, as UPPs vêm passando por eventos críticos que causaram o aumento da violência nas comunidades.
"Já temos cabines blindadas e anteparos balísticos simples na UPP São João, do Alemão, de Nova Brasília e da Fazendinha, e estamos montando na Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) para levar a outras comunidades. Nossa estratégia é a ocupação nas partes elevadas dos morros", afirma Blaz.
As novas medidas, no entanto, já encontraram um avanço, segundo ele: "Os ferimentos em 2014 foram mais graves do que os que estão acontecendo em 2015 [tiros de raspão, por exemplo]. Isso mostra uma melhora no preparo dos policiais", analisa.
Blaz fez um apelo para que mais empresas privadas ajudem a UPP a criar projetos sociais e mantê-los dentro das comunidades.
Ameaças do tráfico
Em entrevista ao G1, um morador do morro Dona Marta, que recebeu a primeira UPP em dezembro de 2008, falou sobre a desistência de muitos moradores de participar de projetos sociais dentro da comunidade.
"Tudo por medo do tráfico, né? Das ameaças que a pessoa pode receber", avalia. Blaz ressalta que este é um dos principais desafios das UPPs neste sétimo ano de projeto, principalmente com o público entre 12 e 18 anos.
"Precisamos da participação popular, que o Alemão demonstrou este ano após 100 dias de conflito armado, e que a Maré já demonstra há muito tempo. Temos parcerias com a LBV [Legião da Boa Vontade] em Manguinhos e o Ação Social Pela Música em 19 comunidades, mas precisamos de mais como estes. Precisamos de mais pessoas e empresas que nos ajudem, porque vários dos projetos tocados hoje ocorrem graças aos próprios policiais das unidades", avaliou.
Na Maré, os problemas vividos entre a Força de Pacificação e os moradores, além dos tiroteios frequentes envolvendo traficantes, transformam a instalação de UPPs em um desafio.
"Vamos fazer encontros quinzenais com as associações de moradores da Maré para saber das demandas de segurança naquela área, além de simplesmente enfrentar criminosos armados e criar uma relação de confiança com as comunidades", garantiu Blaz.
A previsão é de que as quatro UPPs previstas para a região fiquem prontas até o primeiro trimestre de 2016. Veja abaixo vídeo do enterro do PM Alex Amâncio, nesta terça-feira (7).
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